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Leandro Vilar

quinta-feira, 4 de novembro de 2010

Dilema astronômico

Hoje quando pensamos no fato de que a Terra é redonda e ela gira ao redor do Sol, é algo que parece ser bem irrelevante para nós, onde qualquer criança no ensino fundamental saberia dizer acerca. No entanto a "relativa paz" que temos hoje a respeito deste assunto de astronomia, galgou por muitos séculos sob ameaças vindas de vários lados. Durante séculos, falar que a Terra era redonda e que ela girava em torno do Sol, era ser chamado de louco, ser perseguido, preso e até mesmo condenado a morte. Fatos estes que ficaram claramente evidenciados no mundo europeu, onde partindo-se da Grécia Antiga a Idade Moderna, após séculos de separação, tratar deste tema perante a Igreja e as Sociedades Cientificas era um dilema.

Entretanto neste texto me prenderei a relatar a história da evolução da concepção astronômica sobre a Terra e o universo do ponto de vista europeu. Claro que é inegável deixar de lado as contribuições dos astrônomos árabes, egípcios, sumérios, hindus, chineses e maias, mas por hora me reterei aos nomes que citarei a seguir.

A Terra é o centro do universo?

No século II um dos grandes nomes da astronomia fora o astrônomo, matemático, físico, geográfo e astrológo Cláudio Ptolomeu (98-170). Ptolomeu é tido por alguns como o mais notório astrônomo de sua época, além de ter deixado também outras importantes contribuições nos campos da matemática, físíca, optíca e geografia. Ptolomeu é conhecido pela sua obra Grande Sintaxe Matematica (140) chamada pelos árabes de Almagisto, obra a qual corresponde a uma coletânea dos saberes astrônomicos do passado. Tendo vivido na cidade de Alexandria, berço da cultura e ciência desta época, desenvolveu seus trabalhos ao longo de sua vida nesta cidade, e sua mais importante contribuição para o estudo astrônomico fora a elaboração da teoria do geocentrismo.

Basicamente o geocentrismo diz que a Terra consiste no centro do "universo" (naquela época universo seria apenas o sistema solar, e não o sentido que temos hoje), onde a Lua, o Sol e os demais planetas conhecidos até então: Mercúrio, Vênus, Marte, Juptér e Saturno, girariam em trajetórias cíclicas ao redor da Terra. Além de Saturno, ficaria o chamado Ciclo das Estrelas Fixas, no qual estariam as Constelações.

Tal concepção fora amplamente difundida no mundo antigo europeu, e continuou a ser a base da verdade ao longo da Idade Média, embora que próximo ao fim do período medieval, muitos estudiosos começaram a contestar a veracidade do modelo ptolomaico.





Representação do século XVI, do modelo geocêntrico de Ptolomeu.

A teoria geocêntrica perdurou d
esde a época de Ptolomeu até o século XV quando Nicolau Copérnico volta a defender a teoria do heliocentrismo, no entanto o impacto da nova teoria não fora de imediato, décadas ainda se passariam até a sociedade acadêmica e a própria Igreja aceitar a verdade acerca da teoria heliocêntrica.
Nicolau de Cusa
Copérnico pode ter se notabilizado com sua concepção do modelo heliocêntrico, mas antes de isso vim acontecer outros já tinham propostas semelhantes. Aristarco de Samos (310-213 a.C) astrônomo grego, fora um dos primeiros a propor que a Terra girava em volta do Sol, e não o contrário como era sugerido até então. Infelizmente os trabalhos de Aristarco se perderam no tempo, e só possuímos poucas referências sobre eles, dentre as quais advenhem de um contemporâneo seu, Arquimedes de Siracusa. Na Idade Média o filósofo, teólogo e cardeal alemão Nicolau de Cusa (ver imagem) (1401-1464), o qual em sua época, tendo sido um pensador do Renascimento, fora um dos primeiros a questionar o modelo geocêntrico de Ptolomeu, Nicolau como um homem douto, pesquisou a respeito e descobriu que havia outros pensadores que discordavam do modelo de Ptolomeu. Nicolau recusou o fato de a Terra estar fixa no "universo" e ser o centro deste, no entanto, também disse que ela não tinha um movimento circular mais aparente. Não obstante, ele também cogitou a existência de vida extraterrestre em outros planetas do nosso sistema solar.

Porém pelo fato de ter sido um filósofo e teólogo, Nicolau não conseguiu embasar matematicamente e astronomicamente suas hipóteses, e muitos a ignoraram e a descartaram. Até mesmo um contemporâneo seu, o astrônomo Georg Peuerbach (1421-1463) embora cogitasse erros no modelo ptolomaico, Peuerbach estava convencido que o modelo de Ptolomeu não era totalmente falho, no entanto acabou morrendo antes de completar suas pesquisas. Por sua vez, seu discípulo, Johann Müller (1436-1476) (mais conhecido pelo pseudônimo de Regiomontanus), deu continuidade aos trabalhos do mestre, mas assim como Peuerbach, Regiomontanus não estava totalmente convencido a respeito do heliocentrismo, de fato ele notou alguns erros no modelo ptolomaico, mas estava mais obstinado a corrigi-los do que desmascarar toda essa teoria. A grande mudança na astronomia, só veio acontecer mesmo Nicolau Copérnico.

O astrônomo, matemático, jurista e médico polaco Nicolau Copérnico (1473-1543) em sua estadia na Itália, passou dez anos estudando astronomia, medicina e direito canônico, neste tempo, Copérnico se familiarizou com as ideias de Nicolau de Cusa, e de outros astrônomos da Antiguidade que defendiam o modelo heliocêntrico. Em suas próprias pesquisas ele concebeu sua hipótese de um modelo heliocêntrico, entretanto, devido a apreensão de publicar suas ideias devido ao seu egocentrismo em respeito as ciências (Copérnico defendia a ciência apenas para aqueles que fossem dignos de aprende-la), e perante a forte imposição da Igreja Católica e das Inquisições, Copérnico abster-se de publicar seu trabalho, o deixando guardado por alguns anos. Até que finalmente um de seus discípulos, o matemático Rheticus o convenceu de escrever um prefácio em sua obra a dedicando ao papa Paulo III (mais tarde Kepler afirmou que tal prefácio não fora autorizado por Copérnico). De qualquer forma sua obra-prima De revolutionibus orbium coelestium (Das revoluções dos mundos celestes) só veio a ser publicada no ano de sua morte.

"Copérnico demonstrou o duplo movimento dos planetas, em torn
o de si mesmos e do Sol, concepção que seria fortalecida pelas observações de Galileu, no século seguinte, e permitiria a emancipação da cosmologia em relação a teologia". (Grande Enciclopédia Larousse Cultural, vol. 7, 1998, p. 1610).

"Copérnico sabia que alguns filósofos gregos haviam sugerido que a Terra se movia, e achava que um ponto de vista mais correto, que incorporasse o movimento verdadeiramente absoluto, poderia surgir se o Sol fosse colocado no centro do universo e a Terra passasse a ser vista como um planeta, percorrendo uma órbita em torno do Sol, como faziam os outros planetas. (RONAN, 2001, p. 67). 

Por mais, que seu livro traze-se inovações acerca do estudo astronômico, um dos problemas que ainda perdurou em sua obra, fora o fato de que Copérnico dizia que os planetas tinha órbitas circulares, algo que só veio a ser corrigido anos mais tarde pelo astrônomo alemão Johannes Kepler.
Página do De revolutionibus orbium coelestium com o desenho de Copérnico ilustrando sua visão do modelo heliocêntrico.

No modelo heliocêntrico o centro do "universo" deixou de ser a Terra e passou a ser o Sol, logo a Terra passou a orbitar junto aos de mais planetas em torno do Sol.

"Imóvel, no entanto, no meio de tudo está o Sol. Pois nesse mais lindo templo, quem poderia esse candeeiro em outro melhor lugar do que esse, do qual iluminar tudo ao mesmo tempo? Pois o universo; de sua mente, por outros; e de seu governante, por outros ainda. [Hermes] o Três Vezes Grande chama-o de um deus visível, e Electra, de Sófocles, de onividente". (trecho Das revoluções dos mundos celestes apud RONAN, 2001, p. 68). 

Entretanto junto a teoria de Copérnico surgiu alguns problemas: se o planeta se movia, então porquê não sentíamos ele se movendo? Porquê as águas (rios, lagos, mares) não se movimentariam para lados contrários? Porquê não estaríamos a mercê de temporais? E vários outros questionamentos foram levantados. No entanto, como o próprio Copérnico na época disse, ele não tinha respostas para tais perguntas, isso só fora respondido nos séculos seguintes. 

A teoria copernicana fora duramente criticada no inicio e por cerca de um século ainda continuou a ser questionada e ridicularizada. Martinho Lutero, chamou Copérnico de louco e desaprovou sua teoria totalmente. Pior ainda fora a resposta da Igreja Católica que considerou a teoria uma heresia, e proibiu seu estudo. 

Porém alguns iriam acreditar em Copérnico e dando continuidade aos seus trabalhos estivera o astrônomo, físico, matemático e alquimista dinarmarquês Tycho Brahe (1546-1601). Brahe não é tão conhecido por aqueles que de fato estão de fora do ciclo da astronomia, ou não estudam a história da astronomia, mas este fora uma figura importante em sua época, considerado por alguns como o mais brilhante astrônomo de sua época a realizar observações dos astros a olho nu (o telescópio só viria a ser inventado alguns anos após a sua morte). Brahe se notabilizou por ter criado novos termos para o vocabulário astronômico, descobriu que as estrelas que estavam além do Sol, ficavam bem mais longe que se imaginava, fora o responsável sob o patrocínio do rei Frederico II, a construir o primeiro observatório astronômico moderno da história, o Uraniemborg (castelo de Urânia), localizado na Ilha de Hven na fronteira da Dinamarca com a Suécia, era o observatório mais avançado do mundo antes da invenção do telescópio. Brahe ajudou a projetá-lo na arquitetura, em sua organização e na projeção de aparelhos, como quadrantes e sextantes. 

Brahe também desmentiu a concepção de Aristóteles acerca da imutabilidade do céu, o mesmo dizia que o céu era imutável era sempre igual, que as "estrelas cadentes" e os cometas e meteoros eram fenômenos atmosféricos. No entanto, Brahe desmentiu isso após dois acontecimentos: primeiro, ele observou a explosão de uma supernova em 1572 na Constelação de Cassiopeia. Na época, ele chamou aquele acontecimento de "nova estrela"; segundo, em 1577 ele observou a passagem de um cometa e ficou intrigado como esse aparentava está bem mais longe que se supunha-se ser um fenômeno da atmosfera. Assim ele continuou a realizar observações, e chegou a conclusão que as estrela e os planetas estão bem mais longe que se imaginava, e que os cometas e meteoros são corpos celestes, logo vagavam pelo espaço e não na atmosfera. 

Brahe também acreditava na teoria copernicana, tal fato o levou a medir a duração do tempo que a Terra levava para dá uma volta em torno do Sol. Ele chegou a resposta de 365 dias. Tal resultado levou a Igreja Católica a repensar sua ideia de que a Terra era imóvel e que não girava em torno do Sol, fato este que também levou a própria Igreja no ano de 1582 a reformular o calendário, trabalho este realizado pelo papa Gregório XIII, o qual concebeu o Calendário Gregoriano, substituindo o Calendário Juliano o qual tinha dez dias a menos, e vigorava desde a época de Júlio César, seu criador.

Brahe após se estabelecer em Praga (atual capital da República Checa) em 1597 a pedido do imperador Rodolfo I deu continuidade aos seus trabalhos e tomou como discípulo o jovem astrônomo Johannes Kepler. Brahe deixou o observatório devido a desentendimentos com os funcionários, não obstante o rei Frederico II, havia morrido, e os subsídios do observatório foram cortados. Ele antes de morrer em 1601, dedicou seu último livro, Mecânica da Nova Astronomia ao rei Rodolfo I.

Johannes Kepler (1571-1630), astrônomo, matemático e físico alemão deu continuidade ao trabalho de seu mestre, Tycho Brahe, os quais foram de grande importância para Kepler desenvolver seus próprios trabalhos. Diferente de seu mestre que tentava conciliar o modelo ptolomaico com o copernicano, Kepler, reijeitou totalmente o modelo geocêntrico e se concentrou e encontrar mais argumentos que embasassem o modelo heliocêntrico. Após anos estudando as órbitas dos planetas, especialmente de Marte, ele constatou que na realidade como já fora dito, Copérnico havia se equivocado em dizer que as órbitas dos planetas eram circulares, Kepler descobriu que na realidade elas eram elípticas. Suas pesquisas o levaram a fundamentar as três Leis de Kepler, que consistem em leis fundamentais da mecânica celeste.
  1. As órbitas dos planetas são elipses nas quais o Sol ocupa um dos focos.
  2. As áreas que cobertas pelo raio vetor que une o Sol ao planeta são proporcionais ao tempo.
  3. Os quadrados dos tempos das revoluções siderais dos planetas são proporcionais aos cubos dos grandes eixos de suas órbitas.
As duas primeiras leis foram lançadas em 1609 em seu livro Nova Astronomia, a terceira lei fora lançada em 1619 no livro Harmonia do Mundo

"O resultado de sua investigação foi publicado em 1609, em A nova astronomia, e nova ela certamente era. Pois o que Kepler havia descoberto quebrava a tradição, tudo aquilo que os gregos e os astrônomos subsequentes tinham considerado consagrado. Ele mostrou, conclusivamente, não só que Marte orbitava o Sol, mas também e muito mais significativamente, que o fazia segundo uma elipse". (RONAN, 2001, pp. 77-78). 

Em seu livro Epítome da astronomia copernicana (1619-1621), dividido em três volumes, Kepler associou suas descobertas acerca da mecânica celeste e outros fenômenos com a teoria heliocêntrica de Copérnico. Tais trabalhos, atiçaram o interesse de outro famoso astrônomo, Galileu Galilei, o qual se correspondeu por algum tempo com Kepler acerca do assunto. Kepler também sugeriu que o universo pudesse ser infinito, que pudesse existir planetas orbitando outras estrelas e que até mesmo a existência de vida extraterrestre assim como Nicolau de Cusa havia sugerido. 

O renomado astrônomo, físico, matemático, filósofo e professor italiano Galileu Galilei (1564-1642) iria mais longe que seus antecessores, ao ponto de ter sido condenado duas vezes pela Inquisição Romana. Galileu em 1609 criou seu próprio modelo de telescópio baseado no já existente, com isso ele iniciou sua história de observações, pesquisas e descobertas. Em 1611 após ter publicado em 1610 o Mensageiro das Estrelas (Sidereus nuntius), fora chamado a Roma para responder a um processo de heresia, em seu livro Galileu defendia a veracidade do modelo heliocêntrico. No entanto o processo não deu em nada, ele teve que assinar um documento pedindo desculpas. Anos mais tarde em 1632 ele publicou outro livro, o  Diálogo sobre os dois principais sistemas do mundo (Dialogo dei massimi sistemi) onde volta novamente a defender o heliocentrismo. Pela segunda vez ele é chamado a depor no Tribunal  do Santo Ofício. Dessa vez para se salvar de uma nova condenação, ele disse que suas ideias não passavam de hipóteses que estavam erradas, que na realidade o modelo de Ptolomeu era o correto. Galileu é absolvido de uma sentença pior, e passa a ficar no ano seguinte em prisão domiciliar em Roma, e posteriormente fora transferido para Florença para viver com a sua família. Reza a lenda que enquanto ele saía do tribunal teria dito: "Eppur se muove" (No entanto, se move), em referência ao fato de que a Terra giraria em torno do Sol. Seu trabalho fora de suma importância para expandir o conhecimento a respeito dos cosmos, e a influência de certos fenômenos deste sobre a terra (Galileu estudou a influência da Lua sobre as mares).

A várias observações que Galileu realizou ao longo da vida, contribuíram para que cada vez mais, ele concordasse com Copérnico, Brahe e Kepler. Além disso, Galileu também deixou importantes contribuições na matemática e na física, exibidas em outros de seus livros. Isso contribuiu para que a física e astronomia fossem repensadas no século XVII. 

"Com as importantes contribuições de Galileu e Kepler, a teoria de Copérnico passou a arrebanhar cada vez mais defensores. No entanto, ela apresentava aida uma deficiência gritante que o próprio autor julgava dificil de ignorar: não havia prova de que a Terra girava ao redor do Sol. De fato, o Universo parecia sugerir o oposto, pois, se o astrônomo polonês estivesse correto, as estrelas deveriam apresentar oscilações ao longo da trajetória do nosso planeta em seu circutio anual. Esse efeito, chamado de paralaxe, nunca tinha sido observado. A Copérnico, só restaria argumentar que as estrelas ficam a uma distância
imensa e, em consequência, suas paralaxes são pequenas demais para serem detectadas. Dois séculos ainda transcorreriam até que um cientista finalmente solucionasse a questão". (HIRSHFELD, 2009, p. 65).

Nos fins do século XVII os trabalhos do notório matemático e físico inglês Isaac Newton (1643-1727), reformularam não apenas a matemática e a física, mas contribuíram para se confirmar as teorias de Kepler e Galileu acerca do movimento dos planetas. 

"Os Principia eram uma obra-prima; foi considerado o maior livro cientifico de todos os tempos. Seu impacto foi imenso. Mas talvez isso fosse apenas o que de devesse esperar, pois, em um único volume, Newton reescrevera toda a ciência dos corpos em movimento com uma incrível precisão matemática. Ele completou o que os físicos do fim da Idade Média haviam começado e Galileu  tentara trazer à realidade; suas três "leis do movimento" formaram a base de todo o trabalho posterior. Newton tinha também resolvido um problema astronômico de 2 000 anos - o movimento dos planetas no espaço". (RONAN, 2001, p. 99).

No século XVIII o astrônomo inglês James Bradley (1693-1762) resolveria um dos últ
imos problemas que ainda fundamentavam dúvidas acerca do heliocentrismo. Se até então de Copérnico a Galileu, nenhum destes haviam conseguido explicar com satisfação o efeito da paralaxe (variação da posição das estrelas de acordo com o observador e o local onde se encontra), fora Bradley que desvendou este último mistério. No ano de 1725 ele iniciou em parceria com o seu tio o astrônomo Molyneux um programa de observação, os dois focaram um telescópio em um determinado ponto do céu para que ficassem restrito apenas as estrelas que seu campo de visão alcança-se. Uma das estrelas observadas fora a estrela Gamma Draconis (Etamin) localizada na Constelação de Dragão. Ao todo foram mais de 80 medições por mais de dois anos, porém Bradley e seu tio ainda não havia respondido a questão da paralaxe.

E meados de 1727, seu tio fora convocado para servir a Marinha Inglesa, assumindo o posto de almirante, Bradley continua com as pesquisas na casa de seu tio. Ele chega conclusão que não era apenas a estrela Gamma Draconis que possuía variações em sua posição no céu, mas todas as outras estrelas também, entretanto o motivo disto ainda não era óbvio. A resposta para este paradigma viria no ano seguinte, enquanto Bradley participava de uma festa abordo de um navio que cruzava as águas do rio Tâmisa, ele ficou intrigado como uma bandeira no mastro do navio mudava sempre de direção, após conversar com os marinheiros, a resposta para seu questionamento veio à tona. O motivo da variação na posição das estrelas, era devido ao fato de que a Terra girava, logo o grau de inclinação do telescópio se alterava, e consequentemente você viria as estrelas em outro local do céu.

"A dança estelar que Bradley observara em Gamma Draconis e em outras estrelas era a prova defintiva de que a Terra orbitava o Sol. O cosmo heliocêntrico era, enfim, confirmado, mas de um jeito inesperado". (
HIRSHFELD, 2009, p. 67).

Em 1729 em uma carta escrita ao renomado astrônomo Edmond Halley (o descobridor do cometa Halley), James Bradley descreve sua teoria sobre a aberração da luz, a justificando como sendo um fenômeno causado pelo movimento de órbita da Terra ao redor do Sol, e consequentemente a variação na posição das estrelas no céu. Com tal descoberta ficou finalmente evidente de que não havia-se mais dúvidas de que a Terra girava ao redor do Sol.

A Terra é redonda?

Outro dilema que envolvia a as
tronomia e a geografia nesta época, fora a questão de que a Terra seria plana ou não. Não se sabe ao certo quando foi que a ideia de que o planeta era plano se concebeu, acredita-se que pelo fato de muitos desconhecerem a noção de planeta e apenas compreender o mundo que podiam ver, então para os homens desta época, o mundo seria apenas aquilo que eles conseguiam ver mais longe possível, sendo assim eles não compreendiam o real tamanho do mundo. Além desta limitação geográfica, nesta questão também impera a condição cultural, onde cada povo se via como sendo ele próprio o centro do mundo e os demais como sendo sua periferia. Gregos, incas, chineses, romanos, mesopostâmios, povos indigenas etc, todos tinham concepções similares, de que eles eram o centro do mundo.

No século IV a.C na época de
Alexandre, o Grande, ele fora instruído pelo próprio Aristóteles, o qual como tendo sido um grande filósofo e homem sábio de seu tempo compartilhava muitas das ideias de sua cultura. Naquela época, a concepção de mundo para os gregos, era que a Península da Hélade (não havia uma noção de Grécia como uma nação unificada) estaria no centro do mundo, e partindo destas terras, para o Oeste estava a Península Itálica, tendo Roma lutando contra seus vizinhos, além disso estava a Península Ibérica, e além desta o Mar Oceano (Oceano Atlântico) considerado o limite do mundo no ocidente. No Norte, os limites conhecidos pelos gregos antigos dizia respeito as florestas e montanhas do centro da Europa, no Sul estava a África com seu vasto deserto, sendo que o Egito era a parte mais conhecida pelos gregos, e no Leste se encontrava a Ásia, onde seus limites ainda eram imprecisos, mas se dizia que se chegava até o Oceano Oriental (Oceano Pacífico). Alexandre em sua época, sabia que a Península Indiana existia e que além desta haveria o oceano, a sua pretensão quando iniciou sua campanha de conquistar a Ásia, era se chegar até este oceano, construir uma frota e contornar a costa asiática pelo sul até o suposto ponto no qual os antigos gregos acreditavam que o rio Nilo no Egito se encontrava com o oceano ao sul. Dessa forma, Alexandre e seus exércitos retornariam para o Mediterrâneo e finalmente para a Grécia.

Por mas,
que as descobertas de Alexandre a respeito da Ásia tivessem contribuído para os geógrafos gregos, a visão dos limites do mundo ainda permaneceu não muito diferente desta época, basta ver a representação da Terra feita pelo próprio Ptolomeu já mencionado anteriormente.


Mapa-múndi com a concepção de mundo vista por Ptolomeu.
Como eu havia dito, não fora apenas os gregos que compartilhavam a ideia de que o planeta fosse plano, vários outros povos tinham a mesma ideia. Os chineses viam o mundo como sendo reflexo do Céu, onde moravam os deuses, sendo assim o mundo seria plano também; os incas chamavam a capital de seu império de Cuzco, localizada hoje no Peru, Cuzco significa o "umbigo do mundo" em referência de que ali era o centro do mundo, além disso eles também chamavam seu império pelo nome de Tawantinsuyu que significa o "império dos quatro cantos" uma referência as quatro provincias pelas quais o império se dividia, e uma alusão aos pontos cardeais, ou seja, os quatro cantos do mundo.

Entre o
s povos da Escandinávia, a chamada mitologia nórdica, concebia o mundo como estando dividido na realidade em nove mundos, os quais ficavam entre três planos: o céu, a terra e o subterrâneo. Tais planos eram sustentados por uma imensa árvore, chamada de Yggdrasil, a qual tinha em sua copa o céu, onde viviam os deuses em Asgard, ao redor de seu tronco estava o mundo dos homens Midgard, e alguns dos outros mundos, e em suas raizes estava os mundos subterrâneos. Ao redor de tudo ficava um imenso oceano que delimitava os limites dos confins da Terra. Os maias também tinha a visão de que o mundo era sustentado por uma grande árvore, e que este era plano e girava sobre um eixo.

Em meio a esta concepção difundida que durou por longos séculos, um homem tentou prov
ar que a Terra não era plana, mas sim redonda. Ele não fora o único, no entanto é o mais conhecido que realizou tal façanha que ironicamente muitos ainda desconhecem. Seu nome era Eratóstenes (275-195 a.C), astrônomo, matemático, geógrafo e chefe por longos anos da Biblioteca de Alexandria, cidade onde passou grande parte de sua vida e ali morreu. Eratóstenes no século III a.C duvidava que a Terra seria realmente plana, e para responder sua dúvida ele decidiu realizar um experimento simples, mas de grande repercussão para seu trabalho.

Erastótenes observou qu
e ao meio-dia os raios do sol incidiam verticalmente em um poço na cidade de Siena (atual Assuã) e que nessa mesma hora, em Alexandria uma torre na cidade apresentava uma sombra. Diante de tais observações ele teria feito a seguinte pergunta: Se o mundo é plano, porque em diferentes locais a sombras não são iguais na mesma hora, já que o Sol iluminaria toda a terra de forma igual?

Com isso ele decidiu realizar um experiment
o, ele pôs uma estaca em Alexandria, e pediu que seus alunos registrassem o ângulo que os raios do sol faziam no poço em Siena em determinadas horas do dia, com estes dados, ele os comparou com o ângulo e o tamanho da sombra da estaca em Alexandria. Com tais dados, Eratóstenes conseguiu calcular a distância de Alexandria a Siena que é de 787 km. Eratóstenes multiplicou a distância de 787 km por 360 graus (divisão de um circulo), então dividiu o valor dado pelo ângulo da estaca em Alexandria que era de 7,2 graus, com isso ele chegou a conclusão que um do meridianos do planeta, neste caso o que chamamos hoje de Linha do Equador, tinha o diâmetro de 39.690 km. O valor exato é de 40.010 km (retirando-se a deformação que o planeta sofre perante a gravidade da Lua quando esta em fase de Cheia, com isso seu diâmetro sofre variações).

Representação do experimento de Eratóstenes para se calcular a circuferência da Terra

Eratóstenes conseguiu calcular o diâmetro da Terra com a margem de erro de praticamente 1%, em uma época sem telescópios, computadores, veiculos, satélites etc. No entanto nem todo mundo acreditou nele, os poucos que ainda levaram a sério sua descoberta, posso citar Estrabão (63 a.C-25 d.C) o qual sugeria que a Terra fosse redonda e Hiparco (190-125 a.C) o qual fora o responsável por criar o sistema das coordenadas geográficas o qual divide o mundo em paralelos e meridianos, como ainda se utiliza nos dias de hoje.


Cristóvão Colombo
No entanto muitos não levaram a sério o experimento de Eratóstenes, e nos séculos seguintes ainda se perdurou a concepção de que a Terra era plana. Eratóstenes não fora nem o primeiro e último a defender a forma esférica do planeta, no século XVI, em meio ao Renascimento, um ousado navegador genovês tinha em mente uma ousada ideia, descobrir uma rota para as Índias seguindo para o Oeste, desbravando as águas do Mar Tenebroso (epíteto dado ao Oceano Atlântico na época), este homem era Cristóvão Colombo (1451-1506).

Colombo antes de ser consagrado
na História como o "descobridor das Américas" ele teve sérios problemas de conseguir patrocinadores para sua tão ousada viagem. Colombo trabalhou alguns anos em Lisboa junto ao seu irmão, em suas viagens pela costa africana, ele teria contestado se realmente a Terra era plana como se dizia. Colombo havia estudado geografia e cartografia, em suas pesquisas ele encontrou um documento que passou a ser conhecido como o Diário do Piloto Anônimo devido ao fato de não se saber quem era seu autor (ainda hoje tal mistério ainda vigora). Neste diário o tal misterioso piloto afirma a existência de terras no Ocidente, ele não define que terras seriam estas, mas Colombo tinha como meta descobrir uma rota pelo ocidente para se chegar aos tesouros das Índias, e tal documento já era uma evidência de que isso poderia er plausível. Além deste documento, havia também as antigas lendas que falavam sobre a existência de terras no Ocidente, na Grécia Antiga, os gregos diziam que no Ocidente ficava o Jardim das Hespérides, lar de deusas e ninfas, um jardim onde crescia maceiras com pomos de ouro. Platão dizia que Atlântida ficava localizada para além dos Pilares de Hércules (nome dado ao Estreito de Gibraltar). Desde o século VI, lendas que percorriam a Irlanda, a Bretanha e a França, diziam que o Brandão (484-577), um dos mais importantes santos da Irlanda, teria realizado uma viagem através do oceano Atlântico e descoberto terras no Ocidente. Entretanto em meio a estas suposições, não podemos esquecer o fato de que por volta do ano 1000, os vikings já haviam estado no que hoje conhecemos como América do Norte.

Assim, C
olombo tinha vários argumentos para reforçar sua empreitada. Em 1484 ele fora procurar o rei de Portugal para patrocinar sua viagem, o rei negou ajuda, em 1485 ele tentou com os espanhóis, também não derá certo, então ele viajou para a Inglaterra, França e Holanda, todos se recusaram a patrocinar uma viagem que parecia beirar a loucura. Finalmente no ano de 1492, com a Espanha unificada sobre a regência de Fernando II de Aragão e Isabel I de Castela, Colombo teve sua tão aguardada oportunidade.
Os três navios da primeira expedição de Colombo: Santa Maria (Gallega), Pinta e Santa Clara (Niña).
Em 3 de agosto de 1492 partindo do porto de Palos de Moguer (Espanha) com três naus (Santa Maria, Pinta e Santa Clara) Colombo iniciou sua viagem pelo Mar Tenebroso (Oceano Atlântico).
Em 12 de outubro de 1492 ele avistou terra (provavelmente a atual ilha de San Salvador), depois disso ele aportou em uma outra ilha (Cuba), e depois em mais outra ilha que batizou de Hispaniola ("pequena Espanha", atual Haiti). Colombo ainda realizaria mais três viagens para estas novas terras, se de fato ele achava que havia chegado em algum lugar das Índias ou acreditava que aquilo eram terras desconhecidas, ainda ficam o debate, mas de qualquer forma sua viagem fora o primeiro passo para se reformular a concepção de que a Terra seria realmente plana.

Fernão de Magalhães
Nos anos seguintes, portugueses, espanhóis, ingleses, franceses e holandeses desbravariam as terras do Novo Mundo, descobrindo seus limites, até que no ano de 1519 o rei de Espanha Carlos V, enviou uma frota de cinco navios lideradas pelo capitão Fernão de Magalhães (1480-1521), com a missão de desbravar os limites das terras conquistas pela Espanha no Novo Mundo, além de descobrir uma rota para o Oceano Pacífico por via maritima, e por fim realizar a primeira viagem de circunavegação conhecida na história.

"Com cinco navios levando 239 homens, inc
lusive o historiógrafo italiano Antonio Pigafetta, Magalhães partiu de Sevilha em 20 de setembro de 1519". (Grande Enciclopédia Larousse Cultural, vol, 15, 1998, p. 3730).
Mapa da viagem de circunavegação iniciada por Fernão de Magalhães. (clique no mapa para ampliá-lo).
Mapa com a rota da viagem de circunavegação realizada por Fernão de Magalhães e sua tripulação entre os anos de 1519-1522. (clique no mapa para ampliá-lo).
Em 29 de novembro a frota passou pela costa de Pernambuco e em 13 de dezembro pela costa do Rio de Janeiro, seguindo em direção ao extremo sul do continente. No caminho um dos navios se perdeu e outro acabou desertando, retornado para a Espanha, Magalhães prosseguiu viagem com os de mais navios. Entre 21 e 28 de outubro de 1520 a pequena frota cruzou um estreito no extremo sul do continente, estreito que viria a se chamar Estreito de Magalhães, era descoberta a rota que ligava o Atlântico ao Pacífico. Por volta de abril de 1521 a expedição se encontrava no arquipélago das Filipinas, em 27 de abril, Magalhães fora morto em um combate local, e a expedição fica sob o comando do capitão Juan Sebastián Elcano (1487-1526).

"Os sobreviventes chegaram às Molucas (06 de novembro) e um dos navios, o Victoria, com 18 homens e comandado por Juan Sebastián Elcano, chegou de volta a Espanha (1522) completando a viagem de circunavegação". (LAROUSSE, vol, 15, p. 3730).

O sofrível sucesso da expedição provou que de fato o mundo era redondo e não plano como se imaginou por longos séculos. Ainda no mesmo século um renomado geógrafo, cartógrafo e matemático flamengo chamado Gerardo Mercator (1512-1594) produziu um dos primeiros mapas-múndis detalhados da superfície terrestre, retratando os continentes conhecidos na época, inclusive a própria Austrália e a Antártida, como pode ser visto no mapa abaixo (clique para ampliá-lo).
Mapa-múndi projetado pelo famoso cartógrafo Gerardo Mercator, século XVI.


Por mais, que o mapa apresente distorções no tamanho e no formato dos continentes e de algumas ilhas, tais imperfeições foram sendo corrigidas nos séculos seguintes, no entanto se compararmos esta projeção com o nosso atual mapa-múndi podemos ver algumas semelhanças, já que o mapa-múndi que utilizamos deriva da Projeção de Mercator. A Igreja Católica ainda persistiria por mais algum tempo em aceitar as novas descobertas, no entanto grande parte da população culta da Europa e das Américas, já no século XVII aceitava que a Terra era realmente redonda.

NOTA: Colombo retornou para o Novo Mundo nos anos de 1493, 1498 e 1502.
NOTA 2: São Brandão era conhecido pelo epíteto de o Navegador, o relato de suas viagens fora descritos no livro Navigatio Sancti Brendani, no entanto ao longo dos séculos houveram várias versões acerca desta história, tendo algumas características próprias.
NOTA 3: Gerardo Mercator era um flamengo, nome dado ao individuo que fala a língua neerlandesa na Bélgica. Em geral se associa os flamengos a região de Flandres, local onde se a uma predominância desta língua em território belgo.
NOTA 3: Credita-se ao fabricante de lentes holandês Hans Lippershey a invenção do telescópio em 1608.
NOTA 4:
Além dos vikings terem chegado a América do Norte, e supostamente também São Brandão e sua tripulação irlandesa, existe lendas e indicios que sugeram que os celtas, gauleses, chineses, japoneses, polinésios etc, também estiveram no continente americano bem antes da viagem de Colombo ser realizada.
NOTA 5: Brahe não fora o primeiro a defender a ideia de que a duração do movimento da translação da Terra durava o período de 365 dias, Copérnico já havia sugerido isso, e além dele, astrônomos maias, hindus, chineses e sumérios, apontavam que tal período era de 365 dias mesmo.
NOTA 6: Por mas, que a Igreja Católica tenha passado a utilizar o calendário gregoriano a partir de 1582, atualmente a Igreja Ortodoxa ainda utiliza o calendário juliano em suas datas ecumênicas.
NOTA 7: O porto Palos de Moguer de onde Cristovão Colombo partiu em sua viagem em 1492, é conhecido mais pelo nome atualmente de Palos de la Frontera.


Referências Bibliográficas:
RONAN, Colin A. História Ilustrada da Ciência da Universidade de Cambridge, volume 3: da Renascença à revolução cientifica. Tradução de Jorge Enéas Fortes, Rio de Janeiro, Jorge Zahar, 2001. 
HIRSHFELD, Alan. O enigma do centro do universoBBC Revista História, São Paulo, v. 12, p. 62-67, 2009.
Grande Enciclopédia Larousse Cultural, v. 4, São Paulo, Nova Cultural, 1998.
Grande Enciclopédia Larousse Cultural, v. 7, São Paulo, Nova Cultural, 1998.
Grande Enciclopédia Larousse Cultural, v. 9, São Paulo, Nova Cultural, 1998.
Grande Enciclopédia Larousse Cultural, v. 11, São Paulo, Nova Cultural, 1998.
Grande Enciclopédia Larousse Cultural, v. 14, São Paulo, Nova Cultural, 1998.
Grande Enciclopédia Larousse Cultural, v. 15, São Paulo, Nova Cultural, 1998.
Grande Enciclopédia Larousse Cultural, v. 20, São Paulo, Nova Cultural, 1998.

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